Acordei bem cedo, lá pelas 10:00 da manhã.
Liguei o liquidificador e mandei um açaí irado para dentro. Joguei video-game
até as 12:30. GTA é foda! Tomei um
banho quente enquanto minha coroa terminava de fazer o almoço. Saí do chuveiro
as 13:30, o rango tava servido.
Esperei minha mãe cortar o meu bife e mandei ver um prato daqueles. Depois de
comer, levei uns 20 minutos para escolher o tênis que usaria, fiquei entre o Nike e o Addidas, por fim escolhi o Addidas.
Peguei minha mochila e conferi o conteúdo: 12 barras de cereal; 1 garrafa pet
pela metade cheia de uma batida da semana passada; 1 garrafa de vinho; 1
bandeira do Corinthians; 2 apitos; e o dinheiro do busão.
A campainha tocou, era o meu amigo, tava na hora de dar linha. Entramos no busão com mais uns vinte manifestantes.
Eu já tava com o dinheiro da passagem
na mão, quando vi a galera toda pulando a roleta. Guardei a grana e pulei
também. O transito tava sinistro,
demorou umas duas horas para chegar no centro. Desci do balaio e já avistei o mulão
de gente, os mano tudo com cartaz
cantando o hino nacional. Eu não sabia a letra, mas já cheguei pulando,
balançando os braços e gritando. Depois do “ouviram do Ipiranga”, eu me
atrapalhei, então mudei a música para “aqui tem um bando de louco...”. Ninguém
percebeu.
Ficamos lá protestando até o final da tarde, o
transito parou, e uma renca de
repórter apareceu pra filmar nóis.
Até o “globocop” tava presente. Até
então, tudo na paz, só a galera cantando, gritando e protestando na moral. Foi
aí que os mano decidiram começar a
marchar rumo à prefeitura. A galera nos prédios deu o maior apoio, piscaram as
luzes, jogaram papel picado em nóis,
foi demais, parecia uma micareta.
Chegamos à porta da prefeitura e a galera
começou a gritar e balançar os cartazes, a maioria gritava: emprego, transporte, saúde e educação.
Na verdade eu não tava entendendo
direito, então perguntei pro meu
amigo.
— Quê que nóis
tá reivindicando, mesmo?
— Sei lá, mano. Repete o que a galera tá falando!
Prestei mais atenção e comecei a gritar: Emprego, transporte, saúde e educação. Emprego, transporte, saúde e educação...
O problema é que tinha um mano perto de mim
gritando “abaixo a ditadura”, e tava
me tirando a concentração, mas logo alguém explicou pra ele e ficou de boa.
A policia ficou na porta, só observando a
galera, tinha mais gente que no jogo do Corinthians. Depois de um tempo, a
galera ficou mais nervosa e uns mano foram pra cima dos polícia. Quando eu vi, fui atrás pra ajudar. Rapidão os homi correram pra dentro do prédio,
então a galera começou a arrancar as grades de proteção. Eu e meu amigo fomos
ajudar. Arrancamos as grades e alguém teve a ideia de quebrar as vidraças.
Quebramos tudo, e ficou caco de vidro pra todo lado. De repente, tinha um monte
de manifestantes tentando segurar a galera que tava quebrando. Eu fiquei bolado.
— Tâmo
junto, galera! – Eu falei, mas ninguém escutou.
Tinha dois grupos lutando pelas grades, não
dava pra ver quem queria quebrar e quem queria parar a quebradeira. Meu amigo
escolheu um lado e começou a puxar, e fui junto e ajudei. De repente, uma bomba
de gás caiu perto de nóis, ficou tudo
enfumaçado e os mano dispersou.
Quando eu vi, tava sozinho, segurando
a grade. Como tinha uns outros mano
quebrando o resto das vidraças, eu também quebrei. Aí a galera começou a
gritar: “violência não, violência não”.
Eu levantei a grade e gritei também: “violência
não, violência não”.
Nessa hora, a coisa ficou tensa. Todo mundo
olhou pra mim, e eu continuava gritando: “violência não, violência não”. Então
eu parei. Larguei a grade e ia votando pra galera quando “o choque” apareceu.
Choveu bomba de gás e logo depois o bicho pegou, bala de borracha comeu e o mulão começou a correr. Procurei meu
amigo, mas ele tinha sumido, corri com a galera, que começou a dispersar pelos
quarteirões. Quando as coisas se acalmaram, voltei a procurar meu amigo, o
achei sentado no meio fio, tinha sido atingido por uma bala de borracha, bem na
barriga, tava sangrando um pouquinho,
mas ele tava bem.
— Tá doendo? – Perguntei.
— Pra
carái! – Ele respondeu. – Vai ficar uma marca.
— Maneiro. – Abri a mochila e tirei a garrafa
de batida e duas barras de cereal. – Come aí, mano.
Meu amigo pegou a barra e a gente ficou lá,
comendo e bebendo a batida. Rapidinho chegou mais uns chegados; tinha um maluco
com um violão, a gente fez um roda e começou a cantar Legião. A bebida acabou
rápido, mas foi legal.
Cheguei em casa duas da madruga. Caí na cama e desmaiei. No dia seguinte, acordei ao meio
dia, com uma ressaca sinistra.
— Ainda bem que o protesto hoje é mais tarde.
– Falei para mim mesmo